Desde 27/06/2019, quando o Executivo Estadual encaminhou para a Assembléia Legislativa a mensagem nº 114/2019 com o projeto de lei complementar nº 53/2019 que propõe dispor sobre a remissão e anistia de créditos tributários, relativos ao ICMS e sobre a reinstituição e revogação de benefícios fiscais, houve significativa (e negativa) reação dos mais diversos setores produtivos. Não sem razão, devo dizer, na minha moderada opinião. A mim, e a opinião é minha apenas, faltaram sensibilidade e habilidade aos técnicos do Executivo e ao governador, em todos os aspectos, no tempo, no modo, nas declarações intransigentes e enfatuadas, enfim.
Ocorre que o Governo do Estado (e não importa quem está no exercício da governadoria, afinal, entendo que o cargo é impessoal), não obstante a obrigação constar na Lei Complementar nº 160, de 07/08/2017, ou seja, um dispositivo que já está em vigor há quase dois anos (1 ano, 11 meses e 17 dias), descuidoso, passou literal e rigorosamente para a última hora, o apagar das luzes, a obviamente tardia iniciativa das inevitáveis providências, porém incluindo na sua proposta, inesperadamente, questões de alta complexidade, acendalhas de polêmicas, que demandam profunda análise e discussão, sem que exista o necessário tempo hábil.
Na mensagem nº 114, de 27/06/2019, as premissas, de aparente virtudes e benfazeja utilidade, são obscuras e intangíveis, não revelando a real intenção, tampouco os benefícios efetivos de curto, médio e longo prazo para o interesse público, quais os setores atingidos, qual a economia de um lado e o incremento da arrecadação de outro. Entremeada, quase que discretamente entre as premissas do Executivo, a engelhada armadilha de “buscar o equilíbrio fiscal com o aumento da arrecadação”, talvez, e estou especulando, no meu direito de supor, o única e verdadeiro leitmotiv da proposta tributária, ou seja, preso a um viés de continuísmo, o Executivo acredita que não há outra saída senão o aumento de carga tributária para equacionar o problema das contas públicas, e, assim, a gestão cara e ineficiente mais uma vez será paga por quem tem coragem, a quase sandice, de empreender e produzir no Estado de Mato Grosso.
Governar não deveria ser sinônimo de cobrar impostos. Na mensagem 114/2019, ainda que se trate de uma questão tributária (o ICMS), não há nenhuma iniciativa do Executivo, mínima que seja, que indique a sua intenção de melhorar a eficiência administrativa. O Estado de Mato Grosso, vale observar, seguidamente tem figurado entre aqueles que superam o limite da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) de 60% da receita corrente líquida em gastos com pessoal, incluindo ativos a aposentados, e não está entre os mais operativos e suficientes segundo o Relato?rio Resumido de Execuc?a?o Orc?amenta?ria da Secretaria do Tesouro Nacional.
Estudo ainda recente do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária – IMEA (do sistema FAMATO), apontou que dentre as principais desvantagens competitivas do Estado de Mato Grosso se destacam a logística, a burocracia, os tributos, a insegurança jurídica e a falta de mão-de-obra, ou seja, 4 em 5 das desvantagens competitivas do Estado são criadas (e mantidas) pelo próprio Estado. E isso faz lembrar o comentário do historiador econômico Joel Mokyr, professor na Universidade Northwesterm, em Chicago, quem cria prosperidade são pessoas e empresas. Cabe ao Estado facilitar o crescimento — e não atrapalhar.
Os 5 Estados mais eficientes no uso dos recursos públicos e entrega de serviços à população são Santa Catarina, São Paulo, Paraná, Pernambuco e Espírito Santo (Ranking Folha). Entre aqueles que entregam mais saúde, educação, segurança e infraestrutura com menos recursos, Mato Grosso ocupa apenas a 17ª posição no quadro, classificado como “pouco eficiente” (o pior entre os Estados da região Centro-Oeste), e, detalhe, pelo 6 Estados melhores colocados tiveram arrecadação ou receitas totais inferiores à nossa (ES-5º, PB-6º, PI-8º, MS-13º, MA-14º e TO-15º). Em comum ao quinteto dos mais eficientes, a objetividade no trato da questão, Santa Catarina (Projeto de Lei nº 174.0/2019, teve a redação final aprovada com 3 artigos, e foi publicado no DIALESC nº 7478, de 22/07/2019, p. 11-12), São Paulo (Decreto nº 64.118, de 26/02/2019, 2 artigos), Paraná (Lei nº 19.777, de 18/12/2018, 4 artigos), Pernambuco (Lei Complementar nº 406, de 28/05/2019, 2 artigos) e Espírito Santo (Lei nº 10.887, de 08/08/2018, 2 artigos), mas isso talvez seja apenas uma simples coincidência… A Lei aprovada em Mato Grosso exigiu uma edição suplementar do diário oficial (nº 27557), tem 63 artigos e 2 anexos, e ainda levará um bom tempo até que seja compreendida na sua integralidade. Um traço cultural característico e desonroso de insistência em um modelo burocrático que, não por acaso, faz o Brasil ocupar a 109ª posição em um total de 190 economias analisadas no quesito “facilidades no ambiente de negócios” (DB 2019, Doing Business, The World Bank – IBRD-IDA).
O que se sabe, ou o que não se sabe ao certo, é que entre 27/06/2019, quando a mensagem 114 aterrissou na ALMT e 31/07/2019, quando enfim foi aprovada pelos parlamentares, sancionada pelo governador e publicada no diário oficial a Lei Complementar nº 631, de 31/07/2019, houve muita discussão improdutiva (apenas o bate-boca), muitas informações desencontradas, noticias aqui e acolá, um Executivo autocrata que faz ouvidos de mercador às necessidades e às solicitações dos contribuintes, os parlamentares que não conseguiam um entendimento, enfim, o debate sobre os temas propriamente ditos, os impactos econômicos para os contribuintes, o reflexo na arrecadação do Estado, foram apressados e apenas superficiais, exaltados, mas infrutíferos. O Executivo fez o que quis e como quis, inclusive com vetos.
De prático e efetivo, a Lei Complementar nº 631/2019, já está em vigor para as disposições relativas a? remissa?o e anistia (desde a publicação, 31/07/2019), para as disposic?ões relativas a? reinstituic?a?o de benefi?cios fiscais (com efeitos retroativos a 08/08/2017), e terá vigência a partir de 01/01/2020 para as disposic?ões relativas a? fruic?a?o de benefi?cios fiscais ou de tratamento alterados.
Como vai funcionar, se vai funcionar, entenderemos e aprenderemos na prática, apanhando, como de costume. O tempo, senhor da razão, nos dirá. Resta ao contribuinte mato-grossense continuar empreendendo intimorato, com o enfrentamento resignado, mas não silencioso (a omissão sempre será onerosa), com a esperança – vigiada – de que nossos dignos representantes públicos, gestores e legisladores, não não se instalem na contramão da eficiência e do esforço colaborativo para gerar crescimento, envolvimento, prosperidade e competitividade. Mato Grosso merece mais.