Na última quarta-feira, 30, durante a reunião de pauta da câmara dos vereadores, a prefeitura de Rondonópolis encaminhou ao legislativo o projeto de lei nº 437 que prevê normas para a ação do trabalho voluntariado na cidade de Rondonópolis. Os vereadores rejeitaram a urgência do projeto de lei com unanimidade, e até questionaram a constitucionalidade do projeto por propor autorização do poder público para ações voluntárias. O projeto irá correr pelas comissões podendo até chegar ao plenário.
Assim como a Associação Comercial, Industrial e Empresarial de Rondonópolis – Acir, outras entidades e a sociedade civil que também realizam trabalho voluntário em instituições da cidade, estão preocupadas com a atitude da prefeitura de encaminhar a Lei nº 437 com urgência para a Câmara de Vereadores. Essas regras poderão distanciar os cidadãos da administração pública e dificultar o trabalho voluntário que é tão importante para a conscientização da cidadania, onde todos juntos lutam por uma cidade melhor.
Diante da preocupação da sociedade na criação do que seriam normas que burocratizariam a ação voluntária que em sua ênfase é o mais puro gesto de solidariedade, empatia e cidadania. A assessoria jurídica da Acir criticou o projeto de Lei nº 437:
Críticas ao Projeto de Lei nº 437.
O prefeito municipal encaminhou à Câmara de Vereadores, sob o regime de urgência, o projeto de lei nº 437 “que institui o serviço voluntário no âmbito da administração direta e indireta do Município de Rondonópolis”, justificando “preencher um lapso existente na nossa legislação municipal”.
Crítica nº 01. Lei Federal. A Lei Federal nº 9.608, 18/02/1998 – que abrange todo o território nacional, sem exceção – dispõe sobre o serviço voluntário, e o prefeito não precisa criar o que já existe, senão e apenas (e quando muito, se for mesmo necessário) estabelecer às diretrizes para o termo de adesão do serviço voluntário, com o objeto e as condições de seu exercício, como prevê a lei federal.
Crítica nº 02. Urgência. Urgente é uma circunstância ou situação grave e que exige resposta imediata. A simples alegação de “lapso na legislação” apenas faz desmerecer a Casa Municipal de Leis, mas não induz à percepção de urgência, principalmente porque a Lei Federal que dispõe sobre o serviço voluntário já tem quase 22 anos de vigência, e não há qualquer outra justificativa do Executivo.
Crítica nº 03. Instituir. O projeto de lei tem a pretensão de “instituir” o serviço voluntário, como se estivesse criando algo novo (e único), e determinando a espontaneidade característica do trabalho voluntário. Talvez o verbo “dispor”, ainda que no sentido de determinar regras, fosse mais adequado à técnica e à finalidade, se houver, de fato, a necessidade.
Crítica nº 04. Copiar e colar. O projeto de lei do Executivo é uma cópia da Lei nº 10.193, de 27/01/2017, do município de Florianópolis, que, diga-se, só não é literal porque houve o cuidado (mínimo) de alterar os nomes dos municípios. Ocorre, porém, que as realidades da capital do Estado de Santa Catarina e do nosso querido município de Rondonópolis são manifestamente distintas. A solução não é única (ou comum) e, sobretudo, não está na primeira página de pesquisa do Google.
Crítica nº 05. Dados concretos. Apesar da “urgência”, o Executivo não apresentou dados ou informes concretos sobre a atualidade do serviço voluntário no âmbito da administração direta e indireta do Município de Rondonópolis que pudessem demonstrar a necessidade de especial regulamentação.
Crítica nº 06. Desincentivo. Os traços característicos do serviço voluntário são a espontaneidade, o engajamento, a caridade, o interesse social, a solidariedade, o comprometimento e a disponibilidade pessoal, mas, no âmbito da administração pública, além disso, será sempre complementar, ou seja, não irá substituir, absolutamente, os deveres, as responsabilidades e as funções públicas. As regras que o prefeito pretende “instituir", com todo o peso das proibições, dos deveres e das restrições propostas nos artigos 10 e 11, principalmente, parecem mais voltadas para inibir a participação voluntária, para desestimular qualquer interesse social, para afastar o povo da administração municipal… um contrassenso!
[…] para a Nação não há segredos; na sua administração não se toleram escaninhos; no procedimento dos seus servidores não cabe mistério; e toda encoberta, sonegação ou reserva, em matéria de seus interesses, importa, nos homens públicos, traição ou deslealdade aos mais altos deveres do funcionário para com o cargo, do cidadão para com o país. Rui Barbosa, na conferência "A Imprensa e o Dever da Verdade” (Obras Completas de Rui Barbosa, V. 50, t. 1, 1923).