A prefeitura municipal de Rondonópolis enviou à Câmara Municipal, o projeto de lei nº 350, que propõem a reestruturação do Conselho Municipal de Saúde e criação de conselhos gestores para cada uma das unidades de saúde vinculadas ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Esses conselhos seriam, a princípio, responsáveis por deliberar, planejar, avaliar, fiscalizar e controlar as ações de saúde no município. Programas como o Saúde da Família (PSFs) e outras unidades públicas, além das instituições filantrópicas como a Santa Casa e o Hospital Psiquiátrico Paulo de Tarso, estão dentro do regimento desse projeto de lei.
O departamento jurídico da Acir, esclarece o projeto de Lei nº 350:
Críticas à mensagem e ao projeto de lei nº 350, de 15/08/2019, de autoria do Poder Executivo Municipal, com a proposta de criação do Conselho Municipal de Saúde e dos Conselhos Gestores das Unidades de Saúde.
Justifica o Executivo que a proposta está assentada na Constituição Federal de 1988, na Lei nº 8.080, de 19/09/1990 (SUS), na Lei nº 8.142, de 28/12/1990 (participação da comunidade na gestão do SUS), na Resolução nº 453, de 10/05/2012, do Conselho Nacional de Saúde, ou seja, a proposição já deveria ter sido resolvida muito antes, e, mais, trata-se de questão que deveria ter sido apresentada e desenvolvida direta e efetivamente com a comunidade, afinal, está propondo a participação da comunidade.
A matéria, contudo, não foi tema de diálogo com o Conselho Municipal de Saúde constituído, não esteve na pauta de assuntos da 10ª Conferência Municipal de Saúde, e também não foi objeto de audiência pública ou de consulta à comunidade, e, sem a participação da sociedade organizada, garantida na legislação, o Executivo já demonstra desobediência à Resolução nº 453, de 10/05/2012, do Conselho Nacional de Saúde, e à Lei Lei nº 8.142, de 28/12/1990.
En passant, a segunda diretriz prevista na Resolução CNS nº 453/2012 orienta que para a instituição e reformulação dos Conselhos de Saúde o Poder Executivo, respeitando os princípios da democracia, deverá acolher as demandas da população aprovadas nas Conferências de Saúde, e em consonância com a legislação, mas nas justificativas da mensagem nº 350 não há menção alguma às demandas da população…Sintomático!
Em verdade, em verdade, a proposta não é para a criação do Conselho Municipal de Saúde, afinal o Conselho já foi criado há tempo pela Lei Municipal nº 1779, de 16/10/1990, e, diga-se tem cumprido o seu papel. O que se tem é uma proposta de atualização legislativa, que não difere muito do modelo legislativo padrão de outros municípios. A “grande novidade” talvez seja a criação dos conselhos gestores das unidades de saúde, que é motivo de desconfiança e desconforto, uma vez que faltou o debate aberto e franco com a comunidade.
A atualização legislativa, de fato, é oportuna e até necessária, dado as muitas modificações ocorridas na Lei Federal nº 8.080/1990, principalmente, mas também em virtude das resoluções, moções e recomendações do Conselho Nacional de Saúde, do Decreto nº 7.508, de 28/06/2011 (que regulamenta a Lei nº 8.080/1990), a Lei Complementar nº 141, de 13/01/2012 (que dispõe sobre os valores mínimos a serem aplicados em ações e serviços públicos de saúde), ainda que a Lei Federal nº 8.142/1990 não tenha sofrido quaisquer alterações, seguindo inalterado o texto publicado no DOU de 31/12/1990.
As diretrizes para a instituição, a reformulação, a reestruturação e o funcionamento dos conselhos de saúde, inclusive a composição, a organização e a competência funcionais, estão fixadas na Lei nº 8.142, de 28/12/1990, o que deverá ser observado com rigor pelos vereadores na avaliação do projeto de lei apresentado, sem descuidar das audiências públicas e da consulta à população, uma vez que _os Conselhos de Saúde são espaços instituídos de participação da comunidade nas políticas públicas e na administração da saúde_ (primeira diretriz da Resolução CNS nº 453/2012).
Crítica nº 01. Art. 1º do PL 350/2019. O projeto do Executivo não informa o caráter permanente do Conselho Municipal de Saúde, conforme define o art. 1º, §2º, da Lei nº 8.142/1990, e a primeira diretriz da Resolução CNS nº 453/2012.
Crítica nº 02. Art. 5º do PL 350/2019. O projeto do Executivo afasta a possibilidade de participação das entidades patronais, das organizações religiosas, dos movimentos organizados de mulheres e das entidades de defesa do consumidor, o que merece ser revisto pela Câmara de Vereadores, permitido maior participação da comunidade e diversidade paritária no Conselho Municipal de Saúde.
Crítica nº 03. Art. 22 até art. 25 do PL 350/2019. Não há clareza alguma na proposição. A avaliação, a fiscalização e o controle da execução das políticas públicas e das ações de saúde são competências e atribuições do Conselho de Saúde, como órgão colegiado e deliberativo, inclusive quanto aos aspectos econômicos e financeiros, conforme estabelece o art. 1º, §2º, da Lei nº 8.142/1990, não havendo razão aparente ou justificativa de fato (e de direito) para transferir tais prerrogativas de função ao conselho gestor da unidade de saúde. Aliás, é da própria natureza do Conselho Municipal de Saúde ser um Conselho Gestor.
Logo, porque falta clareza à proposição, presumindo que o objetivo da criação do conselho gestor da unidade de saúde seja facilitar o entendimento das demandas próprias de uma unidade específica e fiscalizar mais de perto a execução das políticas públicas e das ações de saúde naquele ambiente restrito, para serem submetidas à deliberação do Conselho Municipal de Saúde, há evidente exagero nas atribuições. Como mencionado a necessidade, utilidade e oportunidade desse conselho gestor não está minimamente clara, o conselho municipal e conselho gestor (se for aclarada a função) só deveria atuar no que diz respeito as políticas públicas e ações de saúde, ou seja, não poderá administrar a unidade de saúde seja privada ou publica, (onde administrar está relacionada a gestão empresarial e fiscalizar deve ser uma função restrita aos recursos públicos oriundos do SUS).
Não há dúvida de que o projeto de lei em discussão precisa ser esclarecido para a sociedade civil. A ausência do debate público é um erro grave. Assim, e, portanto, porque o Executivo não o fez (e deveria ter feito), é DEVER moral inarredável da Câmara de Vereadores promover a discussão do projeto de lei com toda a população.